Gregório de Mattos: O que ele escreveria sobre a sociedade atual?
Gregório de Mattos Guerra (Salvador, 23 de dezembro de 1636 – Recife, 26 de novembro de 1696) é considerado o primeiro escritor brasileiro. É considerado o precursor da literatura barroca no país, tendo sua obra dividia entre a lírica (amorosa e filosófica existencialista) e a satírica; algumas com conteúdos eróticos e pornográficos e linguagem de baixo calão. Por atacar a sociedade, a política e a Igreja Católica, acabou ganhando o apelido de "Boca do Inferno".
Criticou desde padres e freis, a fidalgos, governantes e comerciantes.
O poeta baiano criticava a falsa moral, a corrupção e a hipocrisia, em muitos casos a ligação entre religião e política:
"Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
Com sua língua ao nobre o vil decepa:
O Velhaco maior sempre tem capa.
Mostra o patife da nobreza o mapa:
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa;
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.
A flor baixa se inculca por Tulipa;
Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra, o que mais chupa.
Para a tropa do trapo vazo a tripa,
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa."
Ou atacando mais diretamente a cidade da Bahia e os seus homens letrados:
"De dous ff se compõe
esta cidade a meu ver,
um furtar, outro foder.
Recopilou-se o direito,
e quem o recopilou
com dous ff o explicou
por estar feito e bem feito:
por bem digesto e colheito,
só com dous ff o expõe,
e assim quem os olhos põe
no trato, que aqui se encerra,
há de dizer que esta terra
De dous ff se compõe.
Se de dous ff composta
está a nossa Bahia,
errada a ortografia
a grande dano está posta:
eu quero fazer aposta,
e quero um tostão perder,
que isso a há de perverter,
se o furtar e o foder bem
não são os ff que tem
Esta cidade a meu ver.
Provo a conjetura já
prontamente com um brinco:
Bahia tem letras cinco
que são BAHIA,
logo ninguém me dirá
que dous ff chega a ter
pois nenhum contém sequer,
salvo se em boa verdade
são os ff da cidade
um furtar, outro foder."
Devido aos seus ataques contra as elites, Gregório de Mattos foi obrigado a um período de exílio em Angola. Posteriormente pediu perdão e foi permitido a ele que retornasse ao Brasil. No fim da vida, fez poemas religiosos, como em "Buscando a Cristo", onde questionou mesmo que ironicamente rituais católicos, mas demonstrando uma tentativa de compreensão da aproximação com Deus.
Fugaz e ácido, o que Gregório de Mattos escreveria sobre a sociedade brasileira atual, já que, através das suas poesias, podemos perceber certas semelhanças entre a sociedade colonial do século XVII e o Brasil do século XXI? Certamente, com suas metáforas e hipérboles, não faltaria assunto e gente para ser alvo da sua escrita afiada.
É muito fácil conseguir adquirir obras do Gregório de Matos. Antologia Poética e Poemas Escolhidos já foram lançados por editoras populares com preços bastantes acessíveis. Há ainda o filme "Gregório de Mattos", de 2001, com direção e roteiro de Ana Carolina.
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